segunda-feira, outubro 12, 2009

Análise do filme Narradores de Javé 1








A palavra tecida a partir de uma multidão de fios ideológicos,
serve de trama a todas as relações sociais em todos os domínios.
(Mikhail Bakhtin)

O enredo de Narradores de Javé não é linear, isto é, não segue uma seqüência cronológica, desenvolve-se descontinuamente, com retrospectivas, cortes e com rupturas do tempo em que se desenvolvem as ações.
O tempo cronológico mistura-se ao psicológico, da duração das vivências das personagens. O espaço exterior se mistura aos espaços interiores (memória e imaginação das personagens).
Por conta disto, as mudanças de cenário acompanham as situações vividas pelas personagens, nos diferentes espaços e tempos.
No início, um contador de causos encontra sua platéia, às margens de uma represa, num ponto de travessia. Este cenário é visitado regularmente durante o filme, pois os interlocutores, de tempos em tempos, trocam impressões e debatem os fatos narrados. Já o cenário do causo própriamente dito, é uma comunidade muito pequena, perdida no sertão nordestino, chamada Vale de Javé. Neste cenário agreste, a odisséia do povo guerreiro de Javé começa a ser contada, e recomeça quando menos se espera. O causo, a narrativa vinculada a oralidade e a tradição, dá vida a esta história que tem a intenção de rememorar o passado.
Já na abertura do filme, as letras e os sinais de pontuação recebem destaque. Dançam, se encontram, interagindo também com outros objetos (tesoura, sinuca...). Até ideogramas aparecem para compor a idéia de mosaico de que seria apresentada no filme. Esta questão do letramento é abordada de diferentes formas durante a narrativa: na fala das personagens - “Eu que não sou das letras(...)”, nas divisas cantadas, na ideia de fazer um “trabalho científico”, até na ironia da placa pregada na soleira da porta do escrivão Antônio Biá – “Proibida a entrada de analfabetos”.
Excluído da sua comunidade, por ter se aproveitado de seu cargo e posição social para receber vantagens. Neste caso, escreveu cartas que, além de difamar a todos da comunidade, eram exageradamente mentirosas. A ira da comunidade, basicamente formada por analfabetos, levou Antônio Biá a viver bêbado e isolado de todos. O caráter desonesto de Biá reaparece quando o barbeiro oferece propina para aparecer como um dos destaques na história de Javé, e Biá aceita, sem pestanejar. Em alguns aspectos, Biá lembra um pouco Macunaíma – o herói brasileiro por excelência, o herói sem nenhum caráter.
Características de personagens da literatura de cordel também compõem a personalidade de Antônio Biá. Assim como João Grilo, por exemplo, Biá apresenta uma fina ironia, acidez nas críticas e uma falsa erudição, denunciada no uso de expressões como lembranças javélicas ou gróticas, históricas ou pré-históricas.
Apesar de tudo, Antônio Biá é visto como o único que poderá ajudar o povo de Javé, registrando em livro a história gloriosa de Javé. O livro é chamado, inclusive, de o Livro da Salvação. Ele deve transcrever a Odisséia de Indalécio e Maria Dina, além de recuperar detalhes, marcas e provas, para tornar científico o seu registro.
A tradição oral em Narradores de Javé é apresentada não só nas histórias dos mitos de criação da comunidade, mas também nas variações deste mito. Ao aparecer ora como homem, ora como mulher, sertanejo ou ex-escravo, Indalécio reencarna a questão do mito que se transforma através da oralidade do povo que o perpetua em seu imaginário.
Os ditados populares, marcas da cultura oral, também aparecem no filme: “Quem muito fala, dá bom dia a cavalo.” Aliás, as citações de Antônio Biá talvez sejam a única ligação da comunidade de Javé com a cultura letrada ou contemporânea: Clonado em miolo de pão, Einstein ou Santo Agostinho, saionara, formiga ninja, habeas corpus com corpus cristi, entre outras.
Biá é homem que “só sabe escrever a lápis”. Entretanto, escritor criativo, é capaz de “melhorar” algum trecho da narrativa e de criar imagens como o “mar de bois” ou soluções para o roteiro como “sapatos” para o boi roubado. Para a comunidade, entretanto, o que entendiam de histórias escritas se restringia a ver que a mão deveria se mexer sobre o papel, para que algo estivesse realmente sendo escrito.
Assim com Biá levou ao povo de Javé a possibilidade de ter contato com o conhecimento através da leitura e das trocas realizadas entre letrados e não-letrados, o professor, em sala de aula, também será o condutor dos alunos tanto à literatura quanto a cultura contemporânea. Será ele, inicialmente, um escrivão, mas deverá promover seus alunos também a pequenos escritores, sujeitos em seu lugar histórico, capazes de transformá-lo através de seu discurso e intervenções no contexto social.

39 comentários:

maria disse...

eu amei essa pagina me serviu para fazer meu trabalho por causa dele eu vou ganhar alguns ponto na minha media agradeço a vc que criou esta pagina

Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.